“Mais Dados, Melhor Saúde” - Iniciativa científica lança diagnóstico para alinhar Portugal com o Espaço Europeu de Dados em Saúde
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Portugal tem a base, mas falta um edifício para a saúde do futuro
O projeto científico “Mais Dados, Melhor Saúde” aponta que Portugal detém uma base estrutural robusta para a utilização secundária de dados de saúde, mas necessita de um quadro jurídico, organizacional e técnico mais completo para concretizar essa utilização, em linha com o recentemente aprovado Espaço Europeu de Dados em Saúde (EHDS, na sigla inglesa).
O projeto, desenvolvido pelo Instituto Superior Técnico (IST), através do Centro de Estudos de Gestão (CEGIST), com suporte técnico da IQVIA e apoio da Roche, visa apoiar o desenho e implementação de um modelo de acesso secundário a dados de saúde em Portugal.
No fundo, pretende responder-se à questão: “Como podemos potenciar o valor dos dados para desenhar um sistema de saúde mais robusto e centrado nas necessidades das pessoas?”. O lançamento da iniciativa aconteceu no dia 12 de dezembro, na Culturgest, em Lisboa.
O diagnóstico inicial mostra que Portugal parte de uma base favorável (por exemplo considerando a elevada digitalização ou a existência de um número de utente único), mas identifica algumas “lacunas”, como a falta de legislação específica integrada e a ausência de um organismo nacional de acesso a dados.
Segundo os responsáveis do projeto, que estabeleceu uma comparação com casos europeus de referência, estes são alguns dos pontos-chave e desafios identificados:
Vantagens estruturais:
Elevada digitalização e centralização técnica: forte base digital e plataformas centrais geridas pela SPMS.
Identificador único de utente: facilita a ligação de dados entre fontes. A ligação a outros números pessoais de identificação (por exemplo, o número de identificação fiscal) tem o potencial de permitir o cruzamento com outro tipo de informação não específica do setor da saúde, com elevado potencial em termos de investigação e geração de evidência.
Experiência em serviços digitais ao cidadão: robustez em ferramentas como o Registo de Saúde Eletrónico.
Lacunas críticas (face ao EHDS):
Quadro jurídico fragmentado: inexistência de legislação setorial específica e integrada para a utilização secundária de dados de saúde.
Organismo Nacional de Acesso a Dados (ONAD) por definir: o modelo institucional, governação, grau de autonomia e financiamento do futuro ONAD ainda estão em aberto.
Ausência de ambientes de tratamento seguros (ATS) remotos nacionais: embora essenciais no modelo EHDS (para que os dados não saiam do ambiente seguro), não existe ainda uma solução nacional implementada de forma generalizada.
Falta de catálogo nacional integrado de metadados: inexistência de um catálogo abrangente que descreva os conjuntos de dados elegíveis para utilização secundária (incluindo microdados).
Recursos humanos e financeiros insuficientes: carências em perfis especializados (ciência de dados, segurança, direito da proteção de dados) e falta de um modelo de sustentabilidade financeira.
Lições europeias
A análise internacional aponta para elementos-chave em modelos europeus de sucesso, como:
Autoridades dedicadas com mandato claro: entidades únicas, como a Findata (Finlândia), dedicadas a gerir o acesso secundário a dados de saúde.
Ambientes de tratamento seguros de dados usados como regra: dados são tratados em ambientes seguros, exportando-se apenas dados agregados, aumentando a segurança dos cidadãos relativamente aos seus dados.
Transparência e envolvimento público: mecanismos que garantem a listagem pública de projetos autorizados e a participação dos cidadãos em conselhos consultivos e estratégias de comunicação.
Próximos passos: recomendações estratégicas
Nos próximos meses, a iniciativa “Mais Dados, Melhor Saúde” irá intensificar o debate com um grupo de cerca de 20 peritos nacionais (incluindo representantes de instituições governamentais, prestadores de cuidados, academia, doentes e entidades sectoriais).
O objetivo final é a formulação de um documento com recomendações que ajudem Portugal a construir uma estrutura de acesso secundário a dados de saúde eficaz, segura e alinhada com as prioridades europeias, transformando a atual base digital em conhecimento de valor público.
A resposta a estes desafios até 2029 é vista como crucial para impulsionar a investigação, melhorar o planeamento do Sistema de Saúde e reforçar a transparência.