Convidado Especial – Fernando Almeida

Instituto Ricardo Jorge

“Há uma fadiga da pandemia”

Presidente do Instituto Ricardo Jorge anuncia que vão ser feitos mais inquéritos serológicos a nível nacional

Está ao comando de uma instituição que tem estado bem no centro da gestão da pandemia. É nosso Convidado Especial o presidente do Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA).

Fernando Almeida afirma que a pandemia tem tido muitas ondas e nem todas elas ligadas diretamente à patologia Covid-19. Destaca as vagas do impacto social e económico, da saúde mental, da preocupação com as outras patologias não-Covid...e também uma onda de protagonismo, em que se multiplicam supostos peritos em comentários mediáticos.

“Há uma onda social e mental em que se percebe que há aquilo a que se pode chamar de uma fadiga da pandemia. Os profissionais de saúde estão cansados e, de uma forma geral, as pessoas estão cansadas”.

Às consequências da doença e a uma vaga de cansaço, Fernando Almeida junta aquilo a que apelida de “onda de protagonismo”: “Nunca vi tanto perito a falar na televisão sobre tudo e mais alguma coisa”.

Com múltiplas funções no combate e gestão da pandemia provocada pelo novo coronavírus, o INSA tem tido um papel central e único.

Foi a instituição que realizou o primeiro inquérito serológico nacional, que permite a pesquisa de anticorpos para determinar se uma pessoa teve contacto com o novo coronavírus e avaliar a potencial extensão da infeção a nível nacional.

Em julho, os resultados apontaram para que 300 mil portugueses pudessem já ter sido infetados. Uma prevalência de 3%, alinhada com os noutros países.

Mas o inquérito serológico nacional não vai ficar por aqui. Fernando Almeida anuncia novos passos:

“Temos previsto continuar a fazer a monitorização e, no final desta onda, vamos fazer outro inquérito serológico. Apontamos que possamos, ao longo do tempo, fazer um total de cinco inquéritos neste ano e no próximo, não só na população geral, mas também em setores específicos, como nos profissionais de saúde”.

Depois desta nova onda da pandemia, o INSA pretende determinar a extensão potencial da infeção e verificar se, em termos de anticorpos, as pessoas ficaram realmente protegidas ou não.

A “casa” em que se determina o famoso R0 da pandemia de Covid-19

Foi no laboratório nacional de referência em saúde que se realizaram os primeiros testes de diagnóstico à Covid-19 em Portugal.

“Mas o nosso papel não se fica na área do diagnóstico. Temos ajudado a capacitar outros laboratórios do SNS para o diagnóstico molecular. Somos a entidade que valida a metodologia de outros laboratórios. Também coordenamos a reserva estratégica de reagentes do SNS. E temos feito um trabalho intenso na área da sequenciação genómica do vírus e, através disso, conseguimos saber, por exemplo, qual o tipo concreto e qual o seu percurso geográfico.”

Há ainda todo o apoio ao planeamento e projeção da epidemia, prevendo ondas, estudando vagas e antecipando cenários.

Dentro deste trabalho de modelação, é aqui que se determina diariamente o muito citado R0, que permite indicar quantas pessoas serão infetadas, em média por um único doente.

“O R é complexo de determinar, mas simples de perceber. Um R igual a 1 significa que um infetado pode transmitir a uma pessoa. Quando o R se situa abaixo de 1, o vírus tem tendência a desaparecer. Mas se tivermos um R de 2 ou 3, começamos a duplicar ou triplicar os casos. Com modelação estatística, conseguimos determinar o R e projetar como se vai comportar”.

Fernando Almeida explica que este indicador é um poderoso auxílio na tomada de medidas e espelha também os comportamentos coletivos:

“No início da epidemia, quando começaram as medidas de confinamento, foi logo nítido o abaixamento do R0. Todos os dias enviamos estes novos relatórios para o Ministério da Saúde. É como se fosse um boletim meteorológico, que aponta previsões de casos e de óbitos. A maior parte dessas previsões tem estado certa”.